MPF recomenda suspensão de processo seletivo no Acre por exigências indevidas a candidatos indígenas

Exigência de declarações com carimbo e modelo padronizado foi considerada desproporcional pelo Ministério Público Federal.

O Ministério Público Federal (MPF) recomendou à Agência Brasileira de Apoio à Gestão do SUS (AgSUS) a suspensão imediata do processo seletivo simplificado para o Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Alto Rio Purus, no Acre, após identificar exigências consideradas ilegais e desproporcionais para a comprovação da identidade étnica dos candidatos indígenas.

A medida foi adotada pelo procurador da República Luidgi Merlo Paiva dos Santos e teve origem em uma manifestação apresentada por um candidato indígena. Segundo o relato, o Edital nº 81/2025 passou a exigir a apresentação de uma Declaração de Pertencimento Étnico e de uma Declaração de Residência em Aldeia, ambas obrigatoriamente assinadas e carimbadas por cacique e liderança local, exclusivamente no modelo padronizado pelo próprio edital.

De acordo com a representação, a exigência desconsidera a realidade de comunidades localizadas em áreas de difícil acesso, obrigando os candidatos a deslocamentos que podem levar dias apenas para a obtenção de novos documentos, mesmo quando já possuem declarações oficiais emitidas anteriormente.

O candidato também apontou que editais anteriores da própria AgSUS continham as mesmas restrições, o que indicaria a existência de um problema estrutural na formulação das regras do certame.

Após análise do caso, o MPF concluiu que as exigências configuram excesso de formalismo e afrontam os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. O órgão também avaliou que condicionar a identidade étnica à apresentação de documentos estatais ou a modelos rígidos viola direitos indígenas, além de contrariar entendimentos já firmados pela própria instituição em situações semelhantes.

Outro ponto destacado pelo MPF diz respeito às condições materiais existentes nas aldeias. Segundo o órgão, muitas comunidades não dispõem de equipamentos básicos, como impressoras, e a exigência de carimbo, instrumento inexistente para grande parte das lideranças tradicionais, cria uma barreira injustificável ao acesso dos povos indígenas a oportunidades de trabalho, inclusive em funções cujo exercício depende justamente do pertencimento étnico e do vínculo comunitário.

Na recomendação encaminhada à AgSUS, o MPF solicita a retificação do edital para eliminar a exigência de carimbo, admitir a apresentação de declarações emitidas anteriormente pelas lideranças e aceitar documentos produzidos pelas próprias comunidades, desde que contenham as informações essenciais previstas no certame. Também foi recomendada a correção das normas referentes aos critérios de avaliação, que atualmente condicionam a pontuação étnica exclusivamente ao uso do modelo de declaração anexado ao edital.

Além disso, o Ministério Público orienta que, após a realização das adequações, o prazo de inscrição seja reaberto para candidatos indígenas, garantindo um período mínimo de sete dias úteis para a entrega da documentação, em respeito aos princípios de razoabilidade e ao contexto de acesso limitado em determinadas regiões.

A AgSUS tem prazo de cinco dias para informar ao MPF se irá acatar a recomendação e apresentar um cronograma para cumprimento das medidas. Em caso de não acatamento ou ausência de resposta dentro do prazo estipulado, o Ministério Público Federal poderá adotar as providências judiciais cabíveis.

Com informações da Assessoria de Comunicação MPF/AC.

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